Um texto bairrista sobre o mexido mineiro
O mexido mineiro, que em outras partes do país tem como primos a “mistura” e o “arrumadinho”, é feito de tantas maneiras quantas se puder imaginar nas vastas quatrocentas e setenta e uma cidades de Minas Gerais.
Dia desses, fiz uma versão inspirada na farofa que o seu Lúcio, um produtor daqui de Belo Horizonte, me ensinou enquanto embrulhava o maço de taioba manteiga do seu quintal, que eu tinha acabado de comprar. Também tentava me convencer a levar o feijão de corda para casa), para poder fazer a receita de farofa da tia dele:
“Leva, menina! É só pegar esse feijão de corda, deixar no molho pelo menos uns quinze minutos, mais ou menos, daí escorrer, cozinhar em água nova com sal até ficar naquele ponto de mordida, sem amolecer demais. Depois, faz uma farofa com farinha de mandioca amarela graúda misturada com farinha de beiju, e na hora de servir adiciona o feijão de corda que você precisa cozinhar antes – esqueci de falar, aí vem o arroz e a taioba picadinha. Amo com linguiça”.
Obviamente comprei todos os ingredientes, tanto a farinha baguda quanto a de beiju. No dia seguinte fiz a farofa da tia do seu Lúcio conversando com a Marcela, minha irmã mais nova, por uma chamada de vídeo. Mostrei uma versão que no lugar da carne leva tofu defumado ralado e contei pra ela que na maior parte das vezes uso jaca desfiada ou umbigo de banana da terra. Quando não tem uma coisa nem outra, adiciono sementes ou vegetais para dar mais textura.
Minha mãe faz mexido de outro jeito: ela refoga no óleo bastante cebola e alho picados, adiciona no refogado um vegetal em tiras finas (cenoura, pimentão ou o que tiver em mãos) até soltar bastante água, depois entra com o feijão vermelho cozido sem caldo, arroz, carne moída ou desfiada, vai colocando aos poucos a farinha de beiju flocada e, em seguida, um maço inteiro de couve picada finíssima, ou qualquer outra folha à disposição, até murchar. Para finalizar, um bom molho de pimenta.
Reproduzo a receita da minha mãe com uma intervenção: quando a água dos vegetais refogados fica praticamente seca, eu entro com uma dose de cachaça para dar acidez, o que intensifica muito o sabor. Depois, arroz, feijão e companhia. Por vezes, no lugar da cachaça, coloco o picles que tiver na geladeira, já que nunca fico sem um pote, ou uma colherada de chucrute ou tomate picado.
Já Dona Lúcia, minha aluna, jura que se usar feijão preto cozido ou feijão andu germinado (moyashi) no lugar do feijão vermelho continua sendo mexido do mesmo jeito. E quem ousaria dizer que não é?
No mais, o importante mesmo é a farinha de mandioca: quanto mais nova e torrada no ponto certo, mais textura vai conferir ao mexido. E nem preciso falar que adicionar a gordura escolhida sem dó é importante, né?
Por fim, servir com um limão capeta cortado ao meio para espremer na hora e uma pimenta curtida no vinagre – ou no óleo, para os mais corajosos. Nos botecos da minha cidade é comum ver duas pimentas biquinho frescas no topo do prato, conferindo um contraste especial, além da salsinha fresca picada.
Para quem quiser uma receita que conte com quantidades específicas, eu recomendo esta, da Rita Lobo. Ah, e no blogue tem uma farofa digna de festa, feita com o resíduo do leite de coco, que pode ser colocada no lugar da farinha de mandioca – se você fizer assim, ganhará passe livre para o nível dois da escola-mineira-bairrista-vegetal (risos).
Conserva de alho frito
William, um amigo que estudou comigo no ensino médio, mora e dá aulas nas escolas públicas de Itabirito, cidade que fica a poucos quilômetros de Belo Horizonte. Um dia ele me presenteou com um pote de alho frito super crocante, cortado em finas lâminas e possivelmente frito por imersão, já que perfeitamente dourado. Comi, fiquei encantada e pedi para ele me levar à loja onde comprou.
Foi assim que conheci a famosa Mercearia Paraopeba – famosa pelo menos aqui entre os cozinheiros mineiros, e que o diga o amigo Felipe Rameh, fã número um do Roninho, dono do lugar.
Lá é possível encontrar de panelas de barro a cuscuzeiras, carne vegetal congelada, frutas secas, pratos, coadores, xícaras, compotas, conservas e uma bancada incrivelmente lotada de bebidas e inúmeras outras possibilidades.
Na conta do Instagram, a Mercearia ensina a curar panela de pedra e mostra iguarias como o fubá de canjica, insuperável quando a necessidade é fazer bolinhos de arroz perfeitos para uma fritura por imersão.
E, voltando ao insuperável alho, como não é sempre que dá para pegar a estrada para Itabirito (e também por pura curiosidade), resolvi tentar fazer uns testes para chegar naquele resultado impecável.
Como sei que a maior parte dos meus alunos morre de preguiça das frituras por imersão, e o óleo nunca esteve tão caro, resolvi escrever a forma mais fácil que encontrei de ensinar pra vocês um alho parecido com o vendido na maravilhosa Mercearia Paraopeba.
Juro que vale a pena: corte alhos gordos e descascados com a ajuda de uma faca afiada ou de um mandoline, em quantidade suficiente para encher um tabuleiro previamente untado com óleo em generosa quantidade. Regue com azeite, salpique sal, depois asse no forno a 180ºC. O segredo é vigiar abrir o forno a cada cinco minutos, dar uma sacudida no tabuleiro, garantindo que não estão grudando no fundo, e, se for preciso, ir virando com a ajuda da uma espátula, tomando cuidado para que uma lâmina não se sobreponha à outra, para não grudarem e atrapalharem o processo. Se você der bobeira, o alho queima e fica amargo, intragável!
O alho deve ser guardado num pote de vidro higienizado fora da geladeira, com óleo suficiente para cobrir. Sirva com um um belo mexidão mineiro ou um prato que o valha aí de onde você estiver me lendo. Se fizer, me conta e me marca nas redes? Vou adorar saber.
Vem aí meu primeiro livro de poesia!
Na última edição do Jornalzinho eu comentei que venho trabalhando num livro que reúne poemas escritos nos últimos cinco anos. Então, chegou a hora da pré-venda!
Com os Dois Pés na Cadeira é um projeto que toquei com muita calma: escolhi cuidadosamente cada palavra colocada no papel, contratei pessoas que pensaram comigo no projeto gráfico, editoração, desenhos e diagramação. Depois de tudo pronto, entrei em contato com várias editoras, e a Quintal Edições, situada aqui em Belo Horizonte, topou me publicar.
Quem comprar agora (com desconto!) vai levar pra casa dois postais para emoldurar, desenhados pela Bela Righi, ilustradora que traduziu lindamente a dança de cadeiras e mãos que percorrem os quatro capítulos do livro, como num banquete.
Espero que meus leitores se deleitem com as palavras que, de forma diversa dos outros livros, dessa vez não passam somente pela cozinha!
Maio
Chega a época de caqui
e junto dela os desejos
Todos hão de concordar:
não se pode comer sem lambuzar
os lábios, o buço, o nariz
Sinto no cheiro do inverno um toque acastanhado
uma reconstrução palativa que me leva
para um tempo não linear
Também poncã, pecado e pecã
ouço seu peito e palato, que doce sentir!
Esfrego as mãos
recito um poema pra ti e sirvo, enfim,
o redondo caqui vermelho pungente
com raspinhas finas de limão
15 livros para 15 pessoas sortudas
A Quintal Edições, além de me publicar, permitiu que eu escolhesse títulos de seu catálogo pra sortear aqui! Para quem não conhece, essa é uma editora mineira composta só por mulheres e que nasceu com uma proposta: criar espaço num mercado sabidamente tão restrito para que escritoras mulheres possam começar a encontrar seu lugar como autoras. Trabalhando com tiragens pequenas, sem custos para as autoras, a editora vem dar-lhes respaldo editorial, proporcionando uma edição bem cuidada, com atenção à revisão, diagramação, impressão, divulgação e venda. Quem levou:
Com Os Dois Pés na Cadeira: Rayra Martins
Tudo é química: Monica Pedrosa
Sinais de nascença: Grazio Olivesi
O mistério de haver olhos: Rafaela Borges
Mar sem fundo: Aline Evelyn
Um girassol: Dandara Tinoco
Avesso: Daniel Sartorio
Uma longa pausa: Thaís Campolina
Osso de baleia: Danielle Oliveira
Incômodo conto: Rafael Fucca
Carolinas Catadoras: Roberta Correa
Fadas e copos no canto da casa: Mirna Novaes
Encontros de estrada: Hilda Kozl
Batismo: Talita Diuayla
Digo te amo para todos que me fodem bem: Henrique Arq
Todos os olhos em mim: a presença do racismo nos relacionamentos inter-racial: Bruna Gruber
Planejamento alimentar para ganhar tempo livre
Como de costume, venho abrir em primeira mão apenas 7 vagas para alunos que querem organizar a alimentação de forma personalizada comigo no mês de maio.
O planejamento alimentar é o serviço que mais gosto de prestar, pois consigo estabelecer uma relação individual com cada pessoa, acompanhando todo o processo. Planejando a gente economiza dinheiro, pede menos delivery, evita o desperdício de alimentos e melhora a qualidade do que come, investindo o mínimo de tempo na cozinha. É um investimento para toda a vida! Já meu método de organização abraça dietas prescritas por profissionais e funciona independentemente de você trabalhar em casa ou levar marmitas para o trabalho!
Nesse programa de acompanhamento eu também acompanho os alunos enquanto experimentam fermentações simples para adotarem na vida. Para entender como funciona meu trabalho, me dá um “oi” pelo WhatsApp (é meu número pessoal) ou responda este e-mail.
Quem trabalhou comigo nesta edição:
Revisão do texto: Maria Fernanda Ambuá (@cozinha.ambua)
Diagramação e desenho: Eduardo Albuquerque (@comidailustrada)
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Com amor e com fome,
Carolina Dini